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A pureza e a simplicidade das crianças

Atualizado: 24 de mar. de 2021

Jackson L. da Silva

Campinas

2020

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--“Em verdade vos digo: Se não vos transformardes e vos tornardes como criancinhas, não entrareis no Reino dos Céus” (Mt 18, 3). Aqui está o que o próprio Cristo nos pede. Se você não tinha conhecimento dessa passagem da Sagrada Escritura, pode ficar pensando sobre o que exatamente ela quer nos dizer. Ela expressa para nós o chamado para a vivência de uma virtude que nos coloca em estado de graça, e a consequência deste estado de graça é o nosso coração ligado diretamente a Deus [1]. Essa virtude é a pureza: “Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus” (Mt 5, 8). Os “puros de coração” são aqueles prometidos a ver a Deus face a face e ver sua semelhança a Ele por lhe terem obedecido, vivendo de forma correta e purificando o seu coração, de acordo com o Catecismo da Igreja Católica (CIC 2518, 2519).

--Para São João Bosco, “A pureza é a virtude que mais brilha no paraíso”. No princípio, antes da entrada do pecado no mundo, homem e mulher, criados à imagem de Deus, viviam em estado de inocência original, em completa pureza [2]. Para São João Paulo II, “A pureza é a glória do corpo humano diante de Deus. [...] Da pureza brota aquela singular beleza, que penetra toda a esfera da recíproca convivência dos homens [...]” [2, p. 256].

--Para cumprirmos as exigências da santidade que Deus nos pede, a virtude da pureza precisa ser vivida principalmente em três campos de nossa vida: na caridade, na castidade e no amor à verdade e na ortodoxia da fé, isso porque existe uma relação entre a pureza do coração, do corpo e da fé (CIC 2518), afinal devemos viver em unidade de vida.

--A pureza no campo da caridade dirige todos os nossos meios de santificação, nos dando a condição de chegarmos ao nosso fim (CIC 826). Já na castidade, ela nos mostra como devemos olhar, respeitar e controlar nossos pensamentos perante o corpo da outra pessoa, sabendo que o corpo dela, assim como o nosso, também é templo do Espírito Santo (1 Cor 6, 19). E quando nos referimos ao amor à verdade e à fé, a pureza consiste em acreditar na única verdade da nossa vida, que é Deus, pois só Ele possui a Verdade. E, com isso tudo, mantemos o nosso coração ligado a Deus e conseguimos ver as boas obras do nosso Senhor e Pai. Em suas cartas, São Paulo nos dá muitos ensinamentos sobre a pureza em todos os aspectos de nossa vida. Vale a pena conferir: “[...] Deus não chamou para a impureza, mas para a santidade” (1 Ts 4, 7).

--Temos como reflexo natural de seres imperfeitos olhar para tudo isso que Deus nos pede e achar que é impossível trilhar esse caminho. E, quando esse pensamento vier a cabeça, devemos lembrar dos santos que, por mais jovens que fossem, conseguiam confiar de uma forma infinita em Deus, entregando-se a Ele de maneira completa, sem reserva alguma.

--Um belo exemplo é a história de Santa Teresinha, nascida na França em 1873. Com a perda da sua mãe muito nova, teve como referência sua irmã Paulina. --Vendo sua irmã Paulina seguir a vocação entrando para o Carmelo, Teresinha adoeceu por conta da ausência de sua querida irmã, deixando seu pai preocupado com sua saúde, temendo por ter mais uma perda dolorosa na família. Até que um dia, enquanto suas irmãs rezavam por ela próximas de uma imagem da Imaculada Conceição de Maria, Teresinha viu que a imagem sorriu para ela, e no mesmo momento ficou curada [3].

--Após esse acontecimento, Teresinha decidiu que sua vocação era entrar no Carmelo, e seguiu estudando e rezando para que esse dia chegasse. Mas como era muito jovem, não podia ingressar ao Carmelo, até que em uma viagem à Itália, teve a iniciativa de pedir a autorização do Papa Leão XII, e ele concedeu o direito de ela entrar no Carmelo em 1888. E assim se fez a vida humilde de Teresa, vivendo no Carmelo até que em 1897, quando veio a falecer por meio de uma tuberculose, dizendo suas últimas palavras: “Oh! ... Amo-o. Deus meu, ... amo-vos!” [4]. Santa Teresinha é um grande exemplo de confiança em Deus e de pureza, dizendo que “esperava tudo do Bom Deus, como uma criancinha espera tudo de seu pai”.

--Não podemos nos esquecer de outro grande santo da Igreja, São Domingos Sávio, que se apresentou aos 12 anos a São João Bosco em seu oratório em meio a muitos meninos e pedindo para poder participar das atividades. E Domingos foi muito além de ser apenas “mais um” no oratório de Dom Bosco.

--Mostrou-se interessado pela liturgia e, com vontade incessante de estudar para ser padre, começou a auxiliar Dom Bosco com as coisas. Com o propósito de vida de se confessar frequentemente e comungar sempre que permitido firmado em seu coração, Domingos tinha em sua mente a intenção de querer santificar os dias festivos e falava firmemente que Jesus e Maria seriam seus amigos, seguindo firme no lema escolhido: “Antes morrer do que pecar” [5].

--Vivendo com Dom Bosco, Domingos foi se tornando um menino de vida espiritual gigantesca, e o seu próprio orientador um dia impressionado disse: “Parece-me que temos aqui um bom tecido”. E Domingos, com seu coração sempre aberto, respondeu: “Eu serei o tecido, e o senhor então, seja o alfaiate” [5].

--E assim viveu um santo chamado de “pequeno, ou melhor, gigante do espírito”, por ninguém menos que o Papa Pio XI [5]. Morreu no dia 9 de março de 1857 na cidade de Mondonio e teve a sua biografia escrita pelo seu orientador Dom Bosco, que sempre se emocionava quando a lia novamente [5].

--Como podemos ver, Santa Teresinha e São Domingos Sávio foram dois santos puros e simples, que não desejavam nada além do Céu. Que seu exemplo nos ajude a buscarmos uma vida pura. Para isso, façamos da oração nossa companheira diária, pois, como já dizia São Gregório de Nissa: “A oração é a guarda da pureza”.

--Acompanhados principalmente dos sacramentos da Confissão e da Comunhão, temos alimentos para a alma que serão capazes de nos fazer um novo templo para que o Espírito Santo possa habitar. Ser para o próximo aquilo que Deus quer que sejamos. Luz para o outro, da mesma forma que Cristo se fez presente aqui na terra, nos mostrando ser puro e simples, pois não temos exemplo maior de pureza e simplicidade do que Jesus Cristo e sua Mãe, Maria.

--Um dos primeiros passos para isso é a conversão do nosso coração para que possamos amar a Jesus Cristo e fazer Dele o nosso pastor, como é dito nas Sagradas Escrituras: “Se alguém me ama, guardará minha palavra e meu Pai o amará e nós viremos e faremos nele a nossa morada” (Jo 14, 23) e “Quem permanece na caridade, permanece em Deus e Deus nele” (Jo 4, 16) [6].

--Para nos mantermos puros e com o nosso coração ligado a Deus, devemos evitar as distrações com as coisas terrenas que temos em nosso cotidiano, e nos enamorarmos da pessoa e imagem de Cristo. Deus nos pede a santidade e, porque Ele não nos demanda o impossível, Ele nos dá a graça de podermos participar dos seus sacramentos.

--É somente através do cultivo da pureza em nossos corações que conseguiremos enxergar o nosso próximo com os olhos de Deus, e assim seremos capazes de vivermos nossa vida com a simplicidade das crianças, encantando-nos com a beleza do mundo que nos cerca, encontrando sempre pequenos motivos para sorrir e agradecer, contemplando “as maravilhas que Deus fez para nós” (Sl 125), mesmo em meio às contrariedades que surgirem em nosso caminho.


 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  1. RICARDO, Pe. Paulo. O reino dos céus é das criancinhas. Homilia Diária – 13 de agosto de 2016. Disponível em: <https://padrepauloricardo.org/episodios/o-reino-dos-ceus-e-das-criancinhas-i>. Acesso em: 02 mai. 2020.

  2. SÃO JOÃO PAULO II. Teologia do Corpo: o amor humano no plano divino. 1 ed. Campinas, SP: Ecclesiae, 2014.

  3. Equipe Comunidade Pantokrator. Santa Teresinha do Menino Jesus. Disponível em: <https://pantokrator.org.br/po/mediacenter/formacoes/santa-terezinha-menino-jesus/>. Acesso em: 02 mai. 2020.

  4. Equipe Canção Nova. Santa Teresinha do Menino Jesus. Disponível em: <https://santo.cancaonova.com/santo/santa-teresinha-do-menino-jesus-intercessora-dos-missionarios/>. Acesso em: 30 abr. 2020.

  5. Equipe Paróquia Nossa Senhora Auxiliadora. Santos salesianos. Disponível em: <https://auxiliadoracampinas.org.br/especiais/santos-salesianos>. Acesso em: 02 mai. 2020.

  6. LAGRANGE, Garrigou. As 3 vias e as 3 conversões. 4 ed. Niterói-RJ. Editora Permanência, 2015.

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