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São Josemaria Escrivá e a virtude da ordem

Atualizado: 24 de mar. de 2021

Kamila Silva

Maria Beatriz Prudêncio

Campinas - SP, 2020


Conhecido como o “Santo do cotidiano” ou o ”Santo do ordinário” como declarou São João Paulo II no dia 02 de outubro de 2002, dia da canonização de São Josemaria Escrivá, padre fundador do Opus Dei (“Obra de Deus”, em latim). Esta obra é conhecida mundialmente e presente em mais de 68 países. A Opus Dei tem como fundamento auxiliar as pessoas a encontrar Deus e a santificação por meio das atividades cotidianas, em amar e “estar verdadeiramente” no que se faz. Amar a Deus na execução das tarefas corriqueiras e necessárias à nossa vida.

“Deus não te arranca do teu ambiente, não te retira do mundo, nem do teu estado de vida, nem das tuas ambições humanas nobres, nem do teu trabalho profissional… mas aí, te quer Santo. ” – São Josemaria Escrivá

São Josemaria nasceu no dia 09 de janeiro de 1902 em Barbastro (Espanha), filho de pais cristãos, tiveram mais cinco filhos além do Santo. Na mais tenra infância São Josemaria passou por grandes dificuldades, pois três de suas irmãs faleceram ainda criança trazendo tristeza à família. São Josemaria também foi assolado por uma grave doença quando tinha aproximadamente dois anos de idade, que quase o levou a óbito, entretanto uma promessa esperançosa à Nossa Senhora, feita por sua mãe, foi atendida e o pequeno Escrivá se salvou. Sua mãe, Maria Dolores Albás, passou a dizer-lhe: “Filho, Nossa Senhora deixou-te neste mundo para uma coisa muito grande, porque estavas mais morto do que vivo”. De fato, sua mãe tinha razão [1].

Após uma infância com perdas significativas tanto familiares quanto financeiras, a família de São Josemaria passou por algumas mudanças. Com a chegada da primeira Guerra Mundial seu pai veio a falência e tiveram que mudar-se de cidade iniciando assim um novo ciclo, que mudou completamente sua vida, pois foi na adolescência que ele disse “sim” ao chamado de Deus para a vocação sacerdotal [2]. Esse chamado se deu por meio de um singelo, mas inquietante oferecimento feito por uma carmelita que andava descalça na neve como sacrifício a Deus. Com isso, São Josemaria começou a se questionar do modo como os outros faziam tantos sacrifícios e ele próprio não, foi então que comunicou a família seu desejo de entrar no seminário, ficou cada vez mais próximo aos Sacramentos e esse desejo que inquietava seu coração ecoou na sua decisão de se entregar aos sonhos de Deus para sua vida. [3]

A sua entrada no seminário de São Carlos, em Saragoça, ocorreu no ano de 1920. São Josemaria também estudou direito com a autorização de seus superiores, que era o sonho inicial de seu pai. Os seus estudos foram cumpridos com dedicação e competência, o que anos depois seria como uma marca de seu apostolado, ser santo no cotidiano e amar a Deus nas coisas corriqueiras. Por fim, foi ordenado sacerdote no dia 28 de março de 1925 e teve certeza que sua vida teria como base a Santa Eucaristia [4].

Iniciou seu servir como sacerdote em um povoado com aproximadamente 800 pessoas, porém a fim de terminar seus estudos mudou-se para Madrid, onde também deu aulas de direito canônico. Nesta cidade, assim como no pequeno povoado, viveu profundamente seu ministério, cuidando dos pobres, doentes e mais necessitados, dizia “Servir é a maior santificação que uma alma pode ter”. Sabia que algo mais ainda ecoava em sua alma, um profundo desejo de levar o calor do amor de Cristo a todos [5].

Durante um retiro espiritual São Josemaria vislumbrou o “Opus Dei”, em que pessoas de todas as nacionalidades e raças, culturas e mentalidades ansiavam viver a verdade de Cristo onde estavam, nas suas casas, com seus amigos, nas suas profissões, ou seja, no dia-a-dia, no ordinário. Conseguiu vislumbrar Santos no meio das multidões, santificando-se por meio de seus trabalhos, tarefas mais singelas e anunciando a Cristo de maneira simples e natural, lutando para terem Deus como centro em todas as atividades humanas [6].

E mesmo diante das dificuldades e do tamanho da obra que Deus lhe pedia, São Josemaria fundou a Opus Dei. Em suas orações entendeu que para isso ocorrer não bastava que fosse um sacerdote bom, precisava ser um sacerdote santo e ele dizia: “Eu tenho vinte e seis anos, a graça de Deus e a alegria”. Mais do que um lugar físico, o Opus Dei é uma forma de viver e poder santificar-se por meio do trabalho nobre e limpo [7].

Em junho de 1950, Pio XII concedeu a aprovação definitiva ao Opus Dei afirmando que este é um caminho seguro para viver a santidade. Posteriormente, a própria vida de Josemaria Escrivá tornou-se exemplo desse caminho com sua canonização. São Josemaria nos convida a oferecer tudo a Deus de maneira renovadora, pois chama todos a serem Santos onde estão, com a suas famílias, seus amigos, suas profissões, nos seus momentos de lazer, estudo e em seu estado de vida. Em resumo, é ser Santo onde Deus te colocou, onde Ele sonhou desde toda a eternidade [8, 9].

O Catecismo nos indica:

“A Caridade (Amor) é a alma da santidade à qual todos são chamados. Ela dirige todos os meios de santificação, dá-lhes forma e os conduz ao fim. ” (CIC 826).

Podemos assim dizer que a “forma” que São Josemaria nos apresentou para viver essa santificação e também a caridade da qual o Catecismo se refere, foi amar a todo o momento no nosso dia-a-dia, na simplicidade, ou seja, mesmo que uma determinada atividade seja custosa para nós, e não nos agrade, quando oferecida em sacrifício a Deus, tem valor elevado. A santidade compõe-se de heroísmos. Portanto, o que o Santo nos pede no trabalho é o heroísmo de "acabar" bem as tarefas que nos competem, dia após dia, ainda que se repitam as mesmas ocupações, pois é no cumprimento completo de nossas tarefas diárias que alcançaremos a santidade [10].

Em busca deste heroísmo que nos é proposto - fazer com amor as nossas tarefas diárias - precisamos pedir que a graça de Deus preencha os nossos corações e nos faça crescer nas virtudes que nos possibilitam viver verdadeiramente essa realidade, podendo enxergar que por meio do ordinário recebemos graças extraordinárias. Dentre as virtudes tem uma que se destaca e auxilia na conquista das outras, que é a virtude da ordem. No livro “A conquista das virtudes”, o autor nos leva a entender que a virtude da ordem se resume basicamente em “cada coisa tem seu devido lugar, valor e momento adequado”. Fazendo o exercício concreto de entender esta ideia primária é possível que se veja o verdadeiro valor das coisas e assim entregá-las, por menores que sejam, a Deus, desde o acordar no horário ao dormir no horário, trabalhar, estudar, conviver com a família, os amigos e viver os momentos de lazer [11].

Ver o verdadeiro valor de cada coisa e dar a elas o seu devido lugar nas nossas vidas consiste em viver a ordem, como dizia Santo Agostinho “A paz de todas as coisas é a tranquilidade da ordem”. São Josemaria nos questiona:

“Queres de verdade ser Santo? Cumpre o pequeno dever de cada momento; faz o que deves e está no que fazes. ” - (Caminho, 815)

Ao seguir os ensinamentos do Santo é possível vislumbrar que a ordem se faz presente, pois ser responsável em cumprir o pequeno dever, estar verdadeiramente no que estamos fazendo de todo coração e entendimento, prestar a atenção, dar as coisas seu devido valor e fazê-las com amor é uma forma concreta de amar a Deus e nos santificar. Cumprir o pequeno dever e estar nele requer dedicação, perseverança e atenção, o que se torna mais fácil quando se tem a graça de Deus.

A ordem é fundamental para a vida cotidiana, não apenas para ser usada no âmbito do trabalho e dos estudos, mas como uma virtude atribuída a nós por meio da graça de Deus e que deve ser aplicada também em nossa vida pessoal. Ainda sobre o livro “A conquista das virtudes”, o autor convida o leitor a compreender também que se faz necessário meditar verdadeiramente sobre os propósitos de vida ou plano de vida. Este entendimento é fundamental para que as atitudes sejam direcionadas para atingir os objetivos pessoais de forma clara. Por exemplo, não se pode querer ver o nascer do sol no Brasil acordando às onze horas da manhã, para cumprir esse “propósito” se faz necessário acordar antes que o sol nasça... Acordando às quatro e meia da manhã certamente você verá o nascer do sol. Este exemplo mostra que a ordem nos direciona a alcançar os objetivos de forma muito direta. São Josemaria nos diz:

“Se não tens um plano de vida nunca terás ordem. ” - (Caminho, 76).

Este plano de vida, que dá “sentido” à ordem, se direciona as ações cotidianas, sendo como degraus para atingir os propósitos traçados, assim pode-se “aproveitar” o tempo de maneira ordenada e concreta, colocando cada coisa em seu devido lugar. Se amamos o nosso propósito, nos organizamos para cumpri-lo e conscientes disto teremos uma bela oferta de amor a Deus para a nossa santificação.

Este método de santificação apresentado por São Josemaria Escrivá é seguido em muitos lugares, onde pessoas de todas as idades, nações e culturas oferecem diariamente suas vidas e seus mais simples afazeres por amor a Deus, se dedicando e vivendo de maneira consciente e plena a vontade de Deus e santificando seus dias. Que possamos pedir a intercessão desse grande Santo para nos auxiliar no cumprimento de nossas tarefas e mais que isso, fazê-las com devoção e amor a Deus.


 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  1. Opus Dei. Uma família cristã. Disponível em: <https://opusdei.org/pt-br/article/uma-familia-crista/>. Acesso em: 15 mar. 2020.

  2. Opus Dei. Biografia de São Josemaria. Disponível em: <https://opusdei.org/pt-br/section/biografia-fundador/>. Acesso em: 15 mar. 2020.

  3. Opus Dei. Pegadas na neve. Disponível em: <https://opusdei.org/pt-br/article/pegadas-na-neve/>. Acesso em: 15 mar. 2020.

  4. Opus Dei. Os anos no seminário. Disponível em: <https://opusdei.org/pt-br/article/os-anos-do-seminario/>. Acesso em: 15 de mar. 2020.

  5. Opus Dei. Entre pobres e doentes. Disponível em: <https://opusdei.org/pt-br/article/entre-pobres-e-doentes/>. Acesso em: 15 de mar. 2020

  6. Opus Dei. 1928. Fundação do Opus Dei. Disponível em: <https://opusdei.org/pt-br/article/1928-fundacao-do-opus-dei/>. Acesso em: 15 mar. 2020.

  7. Opus Dei. Cronologia do Opus Dei. Disponível em: <https://opusdei.org/pt-br/article/historia-2/>. Acesso em: 15 mar. 2020.

  8. Opus Dei. Chamados a ser santos. Disponível em: <https://opusdei.org/pt-br/article/espirito/>. Acesso em: 15 mar. 2020.

  9. Opus Dei. Um Caminho - um olhar brasileiro sobre o Opus Dei. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=nM9gfyPurGE&feature=emb_rel_end>. Acesso em: 15 mar. 2020.

  10. CABANIÑA, José Benito. Coerência: edificar a ordem interior. Disponível em: <https://opusdei.org/pt-br/article/coerencia-edificar-a-ordem-interior/#_ftn11>. Acesso em: 29 mar. 2020.

  11. FAUS, Francisco. A conquista das virtudes. São Paulo: Cultor de livros, 2014.

  12. Escrivá, Josemaria. Caminho. São Paulo: Quadrante, 2016.

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